Para o STJ, a responsabilidade civil do empreiteiro não se esgota com o prazo de cinco anos previsto no Código Civil e pode ser regulada pelo Código de Defesa do Consumidor.
De acordo com a interpretação generalista do setor de construção civil, a responsabilidade do construtor se encerra após o prazo de cinco anos da entrega da obra, como disposto no artigo 618 do Código Civil, que estabelece a responsabilidade do empreiteiro pela solidez e segurança da obra.
Para fazer valer esse direito, caso constate vício oculto (aqueles desconhecidos no momento do recebimento do imóvel) dentro dos cinco anos de garantia, a parte lesada tem o prazo decadencial de 180 dias para propor ação redibitória. A ação pode ser apresentada para desfazer o negócio ou rever seu preço com o empreiteiro, como dispõe o parágrafo único do artigo 618 do CC.
Ocorre que, em diversas oportunidades, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento de que a responsabilidade civil do empreiteiro não se esgota no prazo de cinco anos. Isso porque a parte lesada, mesmo encerrado o prazo, tem direito à indenização, desde que comprovada a culpa do empreiteiro.
Em outras palavras, o prazo de cinco anos previsto no artigo 618 do Código Civil (e largamente utilizado como amparo pelos construtores) apenas estabelece um período de garantia em que a culpa do empreiteiro será presumida, ou seja, o empreiteiro será considerado culpado pelo vício oculto identificado até que se prove o contrário.
Nada impede, porém, que a parte lesada opte por ajuizar ação indenizatória dentro do prazo prescricional de dez anos do aparecimento do vício oculto. Nesse caso, entretanto, caberá à parte lesada comprovar a culpa do empreiteiro no evento danoso.
Em complemento, o STJ entende que a responsabilidade civil do empreiteiro pode ser regulada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), já que o empreiteiro será considerado fornecedor quando o imóvel construído for destinado para uso do adquirente.
Seria o caso, por exemplo, de uma pessoa física que adquire um terreno e contrata um empreiteiro para construir a casa em que residirá ou, especialmente, a que adquire um imóvel de uma construtora e incorporadora de empreendimentos imobiliários.
Nesses casos, o STJ vem entendendo que, nos contratos de empreitada regidos pelo CDC, não há exigência de que os vícios ocultos sejam identificados no prazo de cinco anos previsto no artigo 618 do Código Civil.
Isso ocorre porque, apesar de o CDC estipular o prazo decadencial de 90 dias da ciência do vício oculto para que a parte lesada ajuíze ações edilícias – ou seja, menor do que o prazo de 180 dias previsto no Código Civil –, o artigo 26, § 3º, do CDC não estabelece um prazo máximo de garantia.
Justamente por isso, no passado, os tribunais vinham considerando que – sempre que se constatava vício oculto – o prazo geral de garantia de construção civil era o de cinco anos previsto no Código Civil. Criou-se, portanto, o senso comum de que esse seria o prazo máximo de responsabilidade das construtoras.
No entanto, o STJ atualmente entende que, constatado o vício oculto pelo consumidor, em qualquer tempo, ele tem o prazo de 90 dias para exigir em juízo:
• a substituição do produto;
• a restituição da quantia paga; ou
• o abatimento proporcional do preço, como determina o artigo 18, § 1º, do CDC.
Em outras palavras, ainda que o vício oculto tenha sido descoberto após o prazo de cinco anos do recebimento da obra, o consumidor poderá reclamar os danos incorridos, desde que reclame no prazo de 90 dias da sua constatação.
Entretanto, assim como nas relações regidas pelo Código Civil, a possibilidade de o consumidor buscar indenização pela má execução do contrato permanece. Na falta de prazo de prescrição específico no CDC, o STJ vem aplicando o prazo prescricional geral de dez anos contados do conhecimento do dano – de acordo com o artigo 205 do Código Civil. O argumento para esse entendimento se baseia no inadimplemento contratual.
Esse entendimento do STJ de que os consumidores poderão reclamar por vícios ocultos em qualquer tempo acende um alerta para os construtores, já que poderá gerar um conceito de “responsabilidade eterna”, permanente, sem uma definição concreta de quando realmente a responsabilidade se extinguiria.
No entanto, não parece razoável perpetuar no tempo a obrigação legal do construtor. É necessário conciliar os interesses das partes, evitando-se, inclusive, o enriquecimento sem causa.
Possíveis soluções para a questão podem e devem ser sugeridas, considerando obviamente cada caso, mas especialmente questões relativas à vida útil do produto que apresentou o vício oculto reclamado – até porque não se espera que o produto tenha durabilidade eterna.
Diante dessas discussões, é cada vez mais relevante estruturar contratos imobiliários baseados em informações e documentos que possam oferecer o respaldo jurídico legítimo e necessário, tanto para o construtor quanto para o comprador. Tudo para garantir que o espírito da norma seja preservado, especialmente nas relações de consumo.